A nova política de preços da Petrobras: PPI troca de papel, mas não sai de cena

Carla Borges Ferreira, Mahatma dos Santos

A Petrobras anunciou ontem (16/05) mudanças na política de preços da companhia. Como primeiro grande marco da nova gestão, a Diretoria Executiva aprovou a substituição da política de preços orientada exclusivamente pela paridade de importação por uma nova estratégia comercial para definição dos preços do diesel e gasolina no mercado interno.

 

Foto: André Valentim/Agência Petrobras.

 

 

Essa nova diretriz tem como objetivo apresentado garantir flexibilidade à Petrobras na definição de seus preços, que devem se orientar por novas premissas. A companhia introduziu as condições dos mercados locais, custos de produção e rentabilidade como parâmetros para além do preço de paridade de importação (PPI), antes mandatório. Não é o fim da influência dos preços internacionais nos preços da Petrobras, e sim o fim da exclusividade desses fatores na determinação dos preços internos. A periodicidade dos reajustes permanece inalterada, sem data fixa.

 

 

A revisão dessa política era urgente e necessária. Em vigor desde outubro de 2016, o PPI internalizava as oscilações dos preços internacionais do petróleo e derivados ao mercado local, além de incorporar os custos de importação (frete, taxas portuárias, tributos e margens de risco do negócio). Essa prática, combinada a outras decisões da gestão, penalizou tanto os consumidores brasileiros quanto a própria Petrobras. Os brasileiros conviveram com a explosão dos preços dos combustíveis no mercado nacional. De outubro de 2016 até início de maio de 2023, o preço da gasolina nas refinarias aumentou 112,3%, enquanto o do diesel subiu 99,5%. A Petrobras, por sua vez, perdeu participação (market share) no mercado interno, em virtude da escolha política de redução do fator de utilização de seu parque de refino e venda de duas de suas refinarias, a RLAM (2021), na Bahia, e REMAN (2022), em Manaus. Dinâmicas essas que ampliaram a participação dos importadores no mercado nacional de abastecimento.

 

 

A atual estrutura da cadeia de abastecimento nacional, em especial, da etapa de produção de derivados, ainda é restrita e insuficiente para processar o volume necessário para suprir a demanda nacional de combustíveis. O Brasil é autossuficiente na produção de petróleo, mas ainda depende de importação de derivados. Em 2022, segundo dados da ANP, o Brasil importou em média cerca de 26% do Diesel consumido no país e 14% da Gasolina. A adoção do PPI e a tentativa de abertura desse mercado a novos players, com redução da participação da Petrobras nos últimos anos, fracassaram no enfrentamento dessa questão.

 

 

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A justificativa para manutenção do PPI como única referência para os preços dos combustíveis no mercado interno por seis anos é de que essa política se alinhava a estratégia de negócios das últimas gestões da companhia, que se orientava pela maximização da geração de lucros e distribuição de valor para seus acionistas, público-alvo prioritário da companhia. Nestes anos, a Petrobras experimentou um processo de desmonte e desverticalização, em que o PPI, assim como a venda de ativos estratégicos e restrição sistemática de seus investimentos, foram instrumentos importantes para geração de receitas da empresa. Apenas entre 2019 e 2022, a Petrobras distribuiu R$ 332,4 bilhões em dividendos, transformando-se na segunda maior pagadora de dividendos do mundo em 2022, segundo a Janus Henderson.

 

 

A revisão da política de preços da Petrobras é movimento essencial em um cenário global de tensões geopolíticas e crise energética, visto que os preços internacionais continuarão voláteis. A exposição brasileira as dinâmicas e volatilidade internacional dos preços permanece, apesar do Brasil ocupar posição privilegiada entre os dez maiores produtores de petróleo do mundo. A Petrobras, como proprietária de 11 das 19 refinarias e de 81% da capacidade de processamento de petróleo do país, é um ator estruturante para pensar o futuro do abastecimento e dos preços dos derivados no Brasil.

 

 

Nesse cenário, o desafio colocado é a necessidade de expansão da capacidade brasileira de produção de derivados, seja via modernização do parque atual, construção de novas refinarias ou adoção de novas rotas tecnológicas renováveis. No entanto, vale ressaltar que todas essas alternativas são de médio e longo prazo, e requerem investimentos de longa maturação.

 

 

A alteração da estratégia comercial de preços da Petrobras para o diesel e gasolina significa a adoção de instrumento comercial com maior potencial de mitigação da volatilidade dos preços dos derivados no mercado interno, mas não reduz a urgência e dimensão dos desafios estruturantes do setor (dependência de importações e necessidade de ampliar a oferta de derivados no mercado nacional).

 

 

As reduções de preços anunciadas ontem ainda se mantiveram próximas da referência o PPI, tendo em vista que a Petrobras estava praticando preços acima dessa paridade nas últimas semanas. No caso da gasolina, a redução de 12,6% manteve o preço dentro dos limites do PPI calculado pela ANP. Já no caso do diesel, o corte representou um recuo maior em relação aos mesmos parâmetros.

 

 

Será preciso acompanhar as novas práticas comerciais da estatal no próximo período para melhor avaliar esse cenário. Ainda assim, é importante alertar que elementos conjunturais, geopolíticos e comerciais internacionais devem seguir afetando os preços aqui praticados.

 


 

Artigo publicado originalmente em CartaCapital.

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