Na guerra dos prejuízos, Rússia por enquanto tem boas cartas

Foto: Andrey Rudakov / Bloomberg.

 

No dia 6 de março, em Viena, os lideres da OPEP+ (que reúne os países exportadores de petróleo e seus aliados) se reuniram para negociar medidas com o objetivo de frear a desvalorização do barril de petróleo em tempos crise sanitária. Na ocasião, a Arábia Saudita sugeriu que a OPEP e seus aliados, incluindo a Rússia, realizassem um corte na oferta de 1,5 milhões de barris por dia. Tal proposta representaria um aumento nas restrições já existentes da produção, que girava em torno de 2,1 milhões de bdp/dia. Insatisfeito com o novo corte, o governo russo rejeitou o acordo e informou que, a partir do dia 1º de abril, data do vencimento do contrato, deixaria de cooperar com a OPEP e abandonaria qualquer tipo de corte em sua produção.

 

O fracasso da negociação entre a Rússia e a OPEP resultou em um desequilíbrio entre oferta e demanda. O mês de março foi marcado pelo excesso de oferta, agravado pela decisão da Arábia Saudita de intensificar sua disputa por market share, anunciando que aumentaria a produção e passaria a vender petróleo com desconto. O quadro piorou ainda mais com a imposição do confinamento social em diversos países, ação de combate contra pandemia do Covid-19. De acordo com a Rystad Energy,  a demanda gobal deverá cair 16 milhões de bdp/dia já neste mês de abril.

 

Nesse cenário de incertezas, o Brent e o WTI, os dois principais indicadores das cotações mundiais do petróleo, vêm apresentando forte queda, se situando, neste momento, na faixa de US$ 23 e US$ 26, respectivamente. Essa desvalorização atingiu a economia da Rússia, cujo setor energético representa quase dois terços do PIB nacional. Por conta da importância desse setor, o ministro das Finanças do governo Putin, Anton Siluanov, prevê um déficit orçamentário do setor em US$ 39 bilhões para 2020. As principais empresas nacionais também foram atingidas e apresentaram forte desvalorização em seu valor de mercado. Desde o dia 6 de março, as ações da Rosneft e Lukoil na bolsa de Moscou já caíram 18,2% e 16,5%, respectivamente.

 

Contudo, apesar desses pontos negativos, a Rússia conta com um Fundo Nacional de Riqueza, que pode assegurar a sua estabilidade macroeconômica nos períodos de crise. O fundo detém mais de 150 bilhões de dólares (9,2% do PIB nacional) e poderia garantir, se necessário, a saúde financeira por até 10 anos, se os preços internacionais se mantiverem no patamar de US$ 25 por barril.

 

No âmbito geopolítico, tal cenário pode significar uma oportunidade para a Rússia. Isso porque seus principais competidores, EUA e Arábia Saudita, também estão sofrendo com a queda do preço do barril de petróleo. Com a desvalorização do rublo, o custo operacional do barril de petróleo da Rosneft gira em torno de US$ 3,10 por barril, sendo comparável ao custo de US$ 2,80 da Aramco, a estatal saudita. De acordo com o presidente da Rosneft, Igor Sechin, a eficiência da Rosneft pode até ser superior à da Aramco, visto que os sauditas estão vendendo petróleo com desconto.

 

No que tange às disputas com os EUA, a vitória russa parece iminente. Das centenas de empresas de xisto dos EUA, apenas 16 operam em campos onde os custos médios de produção estão abaixo de US$ 35 por barril. A ExxonMobil, por exemplo, precisa de um preço WTI de US$ 26,90 por barril para poder cobrir os custos e despesas de seus campos. Nesse cenário, as petrolíferas norte-americanas começam a ter sérios prejuízos, ao ponto de já haver uma petroleira de médio porte dos EUA, Whiting Petroleum, a decretar falência.

 

O que se percebe, nesse contexto de desvalorização dos preços do petróleo, marcado pelo rompimento da OPEC+ e pela pandemia da COVID-19, é que todas as nações produtoras terão perdas. No entanto, a guerra dos preços pode se mostrar uma oportunidade para Rússia deslocar seus rivais, especialmente os EUA, que necessita de um preço do barril mais elevado para cobrir os custos de produção nos seus campos de xisto. Caberá ao presidente russo, Vladmir Putin, manter a sua estratégia e resistir as pressões internas e externas de fazer um novo acordo de contenção da oferta global.

 

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