Com frio, especulação e cortes de produção, preços do petróleo e do gás explodem

Rodrigo Leão
Broadcast Energia
Imagem na cor azul escuro, com o logotipo do Ineep ao centro.

Mudanças recentes na oferta e demanda de petróleo e gás natural chacoalharam os preços das commodities neste começo de 2021. Primeiro, a cotação do gás natural liquefeito (GNL) na Ásia, em janeiro de 2021, mesmo com a pandemia, atingiu seu valor mais elevado da história. Segundo, o preço do barril do petróleo disparou em fevereiro de 2021, retomando o patamar pré-pandemia.

 

No caso do gás natural, as condições climáticas severas em três dos principais mercados asiáticos (China, Japão e Coreia do Sul) geraram uma demanda adicional que puxaram os preços entre o final de 2020 e início de 2021. No petróleo, por sua vez, o frio nos Estados Unidos afetou a oferta americana. Além disso, a extensão dos acordos entre a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) e outros mercados relevantes, como Rússia, México e Omã – conhecido como o bloco Opep+ – sinalizou uma contenção da produção futura de petróleo. A queda dos volumes disponíveis nesses importantes países produtores, num cenário de forte especulação financeira, foi responsável por gerar uma grande alta nos preços do barril no mercado internacional.

 

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Os principais benchmarks de preços de GNL na Ásia – o Platts JKM, calculado pela S&P Global Platts, e o ANEA, calculado pela Argus – começaram a subir em dezembro de 2020 até explodirem em janeiro deste ano. A S&P explica:

 

A Platts JKM é a avaliação de benchmark do GNL para cargas spot físicas. É base de referência em negócios spot, licitações e contratos de curto, médio e longo prazo no nordeste da Ásia e globalmente. A JKM reflete o valor de mercado spot de cargas entregues em base ex-navio (DES) no Japão, na Coreia do Sul, China e em Taiwan.

 

A Argus detalha:

 

Já a ANEA representa a atividade do mercado regional de GNL. É uma série de indicadores no mercado de swaps do GNL do nordeste asiático no relatório diário de GNL da Argus. Os indicadores de preços spot físicos ANEA representam cargas entregues no navio (des) para portos no Japão, Coreia do Sul e Taiwan, negociadas entre 6 e 12 semanas antes da data de envio

 

Como mostra o Gráfico abaixo, os dois benchmarks cresceram significativamente, entre o início e o fim de dezembro de 2020, saltando de US$ 10 por milhão de BTU (british termal unit) para cerca de US$ 17 por milhão de BTU. Mas, foi em janeiro de 2020 que explodiram os preços do Platts JKM e do ANEA.

 

Gráfico – Cotação do GNL da Ásia para entregas no mês seguinte (out.2020-fev.2021). Em US$ por milhão de BTU

Fonte: S&P Global Platts e Argus.

 

Em 12 de janeiro, a Platts JKM atingiu o recorde de US$ 32,5 por milhão de BTU. Este foi o maior valor para este benchmark de GNL spot asiático desde que foi lançado no início de 2009. Na ANEA, o aumento foi ainda mais impressionante. Em 14 de janeiro, a cotação do GNL asiático se aproximou dos US$ 40 por milhão de BTU.

 

A explicação para esse aumento impressionante dos preços foi principalmente a mudança das condições climáticas na Coreia do Sul, Japão e China, que forçou os países a elevarem drasticamente suas importações de GNL.

 

A S&P Global Platts informou:

 

As províncias do norte da China enfrentaram múltiplas ondas de frio desde dezembro causando escassez de energia e forçando as concessionárias a implantarem todas as fontes de energia disponíveis. Na primeira semana de janeiro, Pequim registrou a temperatura mais fria desde 1966, assim como outras províncias atingiram recordes históricos.

 

No Japão, as concessionárias locais enfrentaram uma escassez de gás natural para produção de energia elétrica. Isso porque o parque solar foi bastante prejudicado, devido às tempestades de inverno. Somado a isso, o consumo de energia do Japão aumentou em 13%, na primeira semana de 2021, apoiado pelo clima frio, segundo a S&P Global Platts Analytics. A Coreia do Sul também viu sua demanda por eletricidade crescer no início de 2021 por conta do inverno severo no país. Em Seul, a temperatura chegou a -18,6 graus Celsius no início de janeiro, a mais baixa em 35 anos.

 

O frio não foi só um problema para as cotações do gás natural. As nevascas que atingiram o Texas, no mês de fevereiro, afetaram a produção de petróleo dos Estados Unidos. Segundo os operadores dos campos americanos, foram deixados de produzir mais de 4 milhões de barris diários. Esse processo gerou um aumento do preço fora dos Estados Unidos, porque vários mercados se organizaram rapidamente para substituir as exportações americanas, principalmente no Mar do Norte. Com o petróleo mais caro da Europa e a escassez americana, os compradores asiáticos passaram a adquirir remessas do Oriente Médio com prêmios mais elevados.

 

Os preços também foram impactados positivamente pela renovação dos acordos de produção da Opep+. Foi decidida a manutenção dos cortes até abril com a Arábia Saudita se responsabilizando por manter fora do mercado 1 milhão de barris de petróleo por dia.

 

As pressões altistas sobre os preços, nesse contexto de grande incerteza, foram reforçados pelos instrumentos especulativos no mercado internacional do petróleo. Os chamados Wall Street refiners, operadores que transacionam volumes maiores de papeis do que o volume físico do produto, atuam de maneira mais agressiva em cenários de grande volatilidade, como o atual, e tonificam a tendência de elevação. “Cresce a utilização de benchmarks para marcar os preços dos contratos, mesmo que não tenham qualquer relação com a troca física entre produtores e refinadores”, ensina uma recente matéria do Le Monde Diplomatique.

 

Esses dois episódios, somados à grande especulação no mercado financeiro de petróleo, fizeram as cotações dispararem desde o final de janeiro. O barril do petróleo Brent saiu de US$ 55, naquele período, para quase US$ 70 neste mês de março.

 

Ainda é cedo para fazer qualquer previsão sobre o futuro dos preços. Muitas das oscilações do último ano refletem eventos conjunturais e ajustes de curto prazo de oferta e demanda. Mas, parece inconteste que, durante em 2021, ainda sob o contexto da pandemia, o valor do petróleo e do gás natural continuará incerto e instável impondo imensos desafios para produtores e consumidores de energia ao redor do mundo.

 


 

 

Artigo publicado originalmente no Broadcast Energia.

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