As fusões e aquisições trazem grandes oportunidades para acelerar o ingresso em energia limpa

Rodrigo Leão
Broadcast Energia
As fusões e aquisições trazem grandes oportunidades para acelerar o ingresso em energia limpa

Nos últimos três anos, a indústria global de petróleo e gás viveu períodos extremamente turbulentos, primeiro em função da pandemia da Covid e depois da guerra entre Rússia e Ucrânia. Oscilações bruscas no preço do barril, redução da demanda por petróleo, inviabilização da produção de petróleo em vários países, possibilidade de desabastecimento entre outros aspectos foram alguns dos eventos que ocorreram durante esse período.

 

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Essas turbulências exigiram uma revisão dos programas de investimentos das empresas de petróleo, buscando maior disciplina de capital e maior eficiência de suas operações. Todavia, isso não significou necessariamente uma diminuição de novos projetos das empresas, mas sim um redirecionamento na forma de atuação e nos segmentos escolhidos. Além de um maior enfoque em energia limpa, observa-se também uma tendência – que já vinha antes da pandemia – de maiores investimentos em projetos via M&A (fusões e aquisições) do que greenfield (investimentos novos), principalmente nos segmentos de midstream e downstream.

 

No caso brasileiro, essa tendência se reforça com a estratégia de desinvestimentos da Petrobras que tem como principal pilar a saída da companhia de setores de logística, distribuição, bem como a redução da sua participação no refino nacional. Esse movimento promove a entrada de novas companhias nacionais e estrangeiras nos midstream e downstream do Brasil. Com isso, a Petrobras vai ficando cada vez mais concentrada em exploração e produção e limitando sua atuação em outros segmentos.

 

Durante o período de cinco anos de 2021-2025, o investimento acumulado do setor energético global deve aumentar 18% em comparação com o período de 2016-2020. Em 2021-2025, os gastos em transmissão e distribuição em energia devem aumentar em US$ 433 bilhões, seguidas pelas energias renováveis em US$ 367 bilhões e pela indústria de petróleo e gás em US$ 209 bilhões, segundo estimativas divulgadas pela S&P Global.

 

Mais especificamente na indústria de óleo e gás, levantamento da área de Research da consultoria Bip mostra que, mesmo com o cenário turbulento de pandemia e guerra da Rússia e Ucrânia, os investimentos via M&A, no segmento de midstream e downstream, cresceram nos últimos anos. Entre 2013 e 2018, houve uma média de 99 episódios de fusões e aquisições, enquanto entre 2019 e 2021 esse número saltou para 153, um crescimento de 55%. Já em 2022, o primeiro trimestre registrou o recorde histórico no midstream com 120 fusões e aquisições. As principais operações ocorreram em países em desenvolvimento, como no caso dos terminais de GNL Quintero do Chile e da distribuidora da PKN Orlen.

 

O Brasil não ficou de fora dessa “onda”. Os últimos anos foram marcados por uma forte transferência patrimonial nesses segmentos, principalmente por parte da Petrobras para outros players. De acordo com levantamento do Ineep, de 2019 a 2021, a estatal vendeu 12 ativos de midstream e downstream que se traduziram num volume de negócios de R$ 77,6 bilhões. Além da Petrobras, outros grandes players, que atuam no país, também investiram na aquisição de outras empresas. A Raízen, por exemplo, comprou ativos de distribuição, logística e renováveis nesse período.

 

As fusões e aquisições trazem grandes oportunidades para acelerar o ingresso em energia limpa

Plantação de cana-de-açúcar, cultura importante para os biocombustíveis. Foto: Kindel Media / Pexels.

Essas operações de venda da Petrobras, em alguns casos, trouxeram novos atores para o mercado nacional de logística. As vendas da RLAM e da BR distribuidora resultaram na formação de duas novas empresas, a Acelen e a Vibra, respectivamente. Em outros casos, empresas já consolidadas no país também adquiriram da petrolífera brasileira. A Transportadora Associada de Gás (TAG) foi comprada pela gigante francesa Engie, enquanto a distribuidora Liquigás foi desinvestida para um consórcio liderado por dois grandes competidores nacionais, a Copagaz e a Nacional Gás.

 

Todavia, a companhia estatal não feito o caminho inverso, ou seja, adquirido novas empresas para fortalecer e diversificar seu portfólio de ativos. Pelo contrário, a empresa tem seguido um caminho de concentrar seus investimentos em exploração e produção, abrindo mão de participar em outros segmentos. 

 

Esse comportamento da Petrobras não coincide com seus pares, principalmente no segmento de energia limpa. Para ingressar de forma mais sólida e com maior expertise em renováveis, várias petrolíferas têm optado por adquirir startups ou empresas consolidadas no setor. A BP, por exemplo, em 2016, adquiriu 43% de participação da empresa Lightsource, por US$ 200 milhões, uma start-up de energia solar com os maiores projetos de desenvolvimento desse segmento na Europa. Em 2019, a BP anunciou o aumento da sua participação no capital acionário da companhia para 50%.

 

Até o final de 2019, a atuação da Lightsource BP estava concentrada somente na Europa, mas novos investimentos já têm sido direcionados para mercados fora do continente europeu. No Egito, a empresa fez uma parceria com a empreiteira local Hassam Allam para instalação de projetos solares com uma capacidade de gerar 100 megawatts. No mesmo período, foi anunciado um investimento de uma usina solar na Austrália com capacidade de 200 megawatts que terá como parceira a empresa Snowy Hydro. No Brasil, a Lightsource BP adquiriu um pacote de empreendimentos capaz de gerar 440 megawatts de energia solar em grandes projetos e 180 megawatts em projetos de pequeno porte.

 

Esse movimento também tem ocorrido com a Shell, a Total entre outras. No caso da Petrobras, a existência de uma empresa já estabelecida no segmento de renováveis, como a Pbio, poderia facilitar a retomada na empresa, ao menos na produção de combustíveis líquidos renováveis. No mercado brasileiro, há grandes oportunidades de produção do etanol e do biodiesel, em razão da nossa elevada competitividade na produção de cana-de-açúcar e de soja. Além disso, a crescente oportunidade de investimento em hidrogênio verde é uma outra fronteira que pode ser explorada.

 

Os M&A, portanto, não significam apenas a oportunidade de atrair novos atores para o Brasil, mas também para facilitar a entrada dos atores nacionais em diferentes segmentos. A transição das energias fosseis para mais limpas, sem dúvida, envolverá grandes movimentos de fusões e aquisições, algo que ainda não parece estar no radar da Petrobras.

 

Artigo publicado originalmente no Broadcast Energia.

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