Abastecimento e refino em 2024: a necessária discussão sobre uma política pública para redução das importações
TN Petróleo

Em 2024, o setor de refino brasileiro apresentou avanços com a assinatura dos termos aditivos ao Termo de Cessão de Conduta (TCC) entre a Petrobras e o CADE, eliminando a obrigatoriedade de desinvestimentos pendentes de refinarias, e com as negociações para a reaquisição da Refinaria de Mataripe, na Bahia, com o intuito de ampliar o portfólio de ativos da estatal.
Contudo, apesar dos esforços da companhia em 2024, inclusive com a inauguração do Complexo de Energias Boa Ventura/RJ, os investimentos permanecem insuficientes para reduzir a elevada dependência do país da importação de derivados.

Refinaria de Paulínia (Replan). Foto: Marcos Peron/Agência Petrobras.
Essa situação é ainda agravada pela falta de uma política estruturada para o setor, o que reforça a manutenção desse cenário no médio e longo prazo.
O Plano Decenal de Expansão de Energia de 2034 (PDE 2034) da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) indica que o parque de refino atual conta com 18 unidades em operação, com uma capacidade total de 2,29 milhões de barris por dia (bpd), em agosto de 2024.
Conforme dados da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), houve crescimento do processamento de petróleo ao longo dos últimos cinco anos, com um fator de utilização total (FUT) variando entre 75,0% e 79,0% no mesmo período.
Paralelamente, as importações de 2023 e 2024 se mantiveram praticamente no mesmo patamar, embora inferiores aos volumes importados em 2022. Desse modo, percebe-se certo avanço na produção nacional, ainda que insuficiente para reverter a dependência externa.
Em 2024, as refinarias da Petrobras tiveram participação significativa na produção de derivados do país. Destacaram-se a REPLAN e REVAP, unidades de refino localizadas no estado de São Paulo, que contribuíram, respectivamente, com 19,7% e 11,7% do total de petróleo processado internamente.
A estatal divulgou recordes de produção de gasolina e diesel S-10 em suas instalações, com a média anual de FUT de 93,2%, comparado a 92,0% em 2023. Ainda assim, o impacto na redução de dependência externa de derivados não foi tão significativo, uma vez que o aumento do FUT não implica necessariamente em maior produção de derivados de alto valor agregado, pois isso depende da tecnologia utilizada nas instalações.
Além disso, o aumento da demanda nacional pode ter reduzido os efeitos do maior uso da capacidade operacional na balança comercial de derivados.
Plano de negócios
Apesar do quadro atual de dependência, o ano de 2024 apontou avanços.
O Plano de Negócios 2025-2029 divulgado pela Petrobras trabalha com a ampliação da capacidade de processamento da Refinaria Abreu e Lima (RNEST), resultando em um acréscimo total de 172 mil bpd nesse ativo.
Com os projetos de revamp de outras refinarias, pretende-se adicionar 120 mil bpd, totalizando uma ampliação estimada de 292 mil bpd.
O Plano também destaca perspectivas para descarbonização do setor, demonstrando a versatilidade de investimentos em favor da transição energética.
Entre as ações previstas, incluem-se investimentos em plantas para produção de Combustível Sustentável de Aviação (SAF), Diesel Verde (HVO) e Diesel com conteúdo renovável (Diesel R).
Em linha com as ações do governo federal para impulsionar a transição energética, esses novos produtos podem ganhar tração com a Lei dos Combustíveis do Futuro (Lei 14.993/2024), que, além de prever o aumento do percentual de mistura obrigatória de biocombustíveis, oferece incentivos para o SAF e o HVO, embora não inclua o diesel com conteúdo renovável.
Outro destaque de 2024 foi a retomada de atividades da Petrobras no segmento de fertilizantes, o portfólio inclui projetos como a retomada da construção da Unidade de Fertilizantes Nitrogenados (UFN-III), em Três Lagoas (MS), e a reativação da fábrica de fertilizantes Araucária Nitrogenados S.A. (ANSA) no Paraná.
Desse modo, a empresa retoma sua participação no abastecimento nacional de fertilizantes, contribuindo para a redução da elevada dependência da importação desse componente chave para a economia brasileira.
Já no contexto dos refinadores privados, em 2024, também ganhou relevância o caso da Refinaria de Manaus (REAM). Desde 2023, a empresa vem se envolvendo em situações de inadimplência no fornecimento de dados, de acordo com a ANP.
Ademais, desde junho do ano passado, segundo dados disponibilizados pela agência, não houve registro de processamento de petróleo, com o FUT permanecendo zerado. Há, portanto, indagações se a infraestrutura em questão atua como uma refinaria ou um mero terminal na região norte.
Esse fato também gerou controvérsias em torno da proposta de emendas na reforma tributária que visou conceder isenção à atividade de refino na Zona Franca de Manaus.
Em janeiro de 2025, o presidente Lula sancionou a proposta liderada pelo Deputado Omar Aziz. Embora alguns setores a considerem como um estímulo à instalação de futuras unidades na região, a medida, hoje, beneficia quase exclusivamente a REAM, gerando possíveis distorções competitivas no setor.
Mesmo que sejam necessários mais avanços, o cenário do refino no Brasil em 2024 simbolizou conquistas para os trabalhadores e um esforço para frear o processo de desindustrialização. A retomada de ativos estratégicos e a ampliação da produção pela Petrobras reforçam seu papel na segurança energética por meio do aumento da oferta de derivados.
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Entretanto, as importações desses produtos permanecem significativas, reiterando a necessidade de investimentos na ampliação da capacidade de refino, na expansão da infraestrutura logística primária e na construção de novos ativos.
Para tanto, é imprescindível implementar visões estratégicas de médio e longo prazo. O desenvolvimento de uma política pública estruturada em favor da reindustrialização do país, do abastecimento nacional e da redução da dependência externa é condição importante para impulsionar a Nova Indústria Brasil, ordenar os investimentos no setor e garantir a geração de emprego e renda para nossa sociedade.
Artigo publicado originalmente na TN Petróleo.