O que a nova expansão do BRICS+ significa para a geopolítica global?
Jornal GGN
O processo de expansão do BRICS+ ganhou um novo capítulo. Sua última Cúpula, realizada em outubro deste ano, anunciou a inclusão de 13 novos países, com o status de “Estados parceiros”: Belarus, Turquia, Cuba, Bolívia, Indonésia, Malásia, Uzbequistão, Cazaquistão, Tailândia, Vietnã, Argélia, Nigéria e Uganda.
Essa inclusão se soma à primeira ampliação do bloco, que incorporou seis novos membros a partir de janeiro de 2024, apesar de o governo argentino de Javier Milei ter desistido da adesão e a Arábia Saudita não ter concluído seu ingresso no bloco.
Ainda que a diversidade de atores participantes signifique um incremento da heterogeneidade do grupo, o novo formato do BRICS+ representa o fortalecimento do Sul Global em relação ao mundo desenvolvido e aprofunda a estratégia da China de ampliar sua esfera de influência global.
Diante da eleição de Donald Trump como presidente dos Estados Unidos, esse movimento chinês tende a reconfigurar o sistema internacional ao acirrar a disputa entre os dois países por espaços de poder.
Uma aproximação do governo de Trump ao governo israelense de Benjamin Netanyahu representará um obstáculo ainda maior a uma possível solução dos conflitos no Oriente Médio.
Se as posições atuais dos Estados Unidos têm sido de bloquear as resoluções de cessar-fogo propostas no Conselho de Segurança das Nações Unidas, é pertinente pensar que a administração de Trump tende a radicalizar as posições do país, especialmente ao incrementar o fornecimento de apoio material – equipamentos e armamentos – a Israel.
O senador Marco Rubio, futuro Secretário de Estado de Trump, afirmou que não há solução diplomática para o conflito em Gaza e já declarou em mais de uma ocasião que o governo israelense deve eliminar completamente o Hamas.
Nesse sentido, além de aprofundar o desastre humanitário já existente em Gaza, a mudança de postura poderia gerar maior instabilidade na região, o que é prejudicial aos interesses do BRICS+, em particular, da China.
Quando se analisa a declaração final da Cúpula do bloco, é possível inferir que os seus membros preferem evitar quaisquer instabilidades no Oriente Médio. Afinal, novas incursões militares por parte de Israel poderiam afetar, por exemplo, instalações petrolíferas do Irã, o que geraria consequências negativas sobre o comércio internacional desse combustível, prejudicando sobremaneira os interesses dos principais países do BRICS+.
Não é novidade o fato de o Irã ser um ator importante para os países do bloco, sobretudo para a Rússia e para a China.
Com o governo russo, o Irã tem desenvolvido laços políticos cada vez mais profundos, avançando em direção ao estabelecimento de uma “parceria estratégica”. Em relação à guerra no Oriente Médio, por exemplo, é notório o apoio russo aos iranianos no conflito com Israel.
Em reunião bilateral ocorrida em outubro, o presidente russo, Vladimir Putin, afirmou que as relações com o Irã são prioritárias e que frequentemente ambos os países convergem em questões sobre a conjuntura internacional. Além disso, a Rússia exporta petróleo à Índia através do Irã, o que demonstra sua posição estratégica.
Com o governo chinês, o Irã também tem proximidade. Embora mais comedida, a posição diplomática chinesa tem sido crítica aos ataques perpetrados pelos israelenses. A China já expressou de modo explícito sua oposição à violação da soberania iraniana, e é sabido que os laços econômicos também são fundamentais, afinal grande parte da exportação do petróleo iraniano tem como destino a China, em que pese as sanções impostas pelos Estados Unidos.
Em outras palavras, eventuais ataques a estruturas petrolíferas do Irã afetariam a economia da Rússia e da China. Tanto a oferta russa quanto a demanda chinesa de petróleo têm como meio de transporte rotas marítimas que estariam diante de um risco mais grave em caso de uma nova escalada dos conflitos.
De acordo com dados do Statistical Review of World Energy 2024, a China é o segundo maior consumidor de petróleo do mundo, atrás dos Estados Unidos. Em 2023, o país consumiu 16,5 milhões de barris por dia, o que representa 16,5% do consumo global. A Índia vem logo em seguida, com 5,4 milhões de barris, enquanto a Rússia é a quinta colocada (atrás da Arábia Saudita), com 3,6 milhões.
Não à toa, na declaração final da Cúpula do BRICS+, a narrativa oficial enfatizou a importância de se perseguir uma transição energética justa sem abrir mão de combustíveis fósseis.
A ampliação da influência chinesa já foi bem-sucedida quando o gigante asiático atuou para restabelecer as relações diplomáticas entre o Irã e a Arábia Saudita, dois grandes exportadores de petróleo. Além de assegurar a oferta de combustível, viabilizando sua segurança energética, a ação da China para pacificar as relações bilaterais fortalece sua liderança em escala global e rivaliza com a posição dos Estados Unidos.
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Nesse sentido, a eleição de Trump servirá como um teste tanto à capacidade chinesa de se consolidar como fiel da balança nos conflitos do Oriente Médio quanto ao desenvolvimento das relações comerciais da China na região.
Se o governo de Trump incentivar a propagação do conflito no Oriente Médio, poderá haver uma desestabilização no comércio de petróleo, um risco que o BRICS+ buscará evitar, afinal, como ilustra a declaração final da Cúpula do bloco, o petróleo ainda é entendido como um recurso de poder e de desenvolvimento econômico essencial para os países do Sul Global.
Artigo publicado originalmente no jornal GGN.