O Global Britain deixa em dúvida como a Grã-Bretanha irá conduzir sua “revolução verde” no curto prazo

Rodrigo Leão
Broadcast Energia
O Global Britain deixa em dúvida como a Grã-Bretanha irá conduzir sua “revolução verde” no curto prazo

A Grã-Bretanha alterou radicalmente sua forma de inserção na economia global, após a aprovação do Brexit. A região, que era uma das principais líderes do projeto da União Europeia, seguiu uma nova estratégia de projeção internacional autônoma. Tal projeto foi detalhado no documento “Global Britain in a competitive age”, que aponta as novas diretrizes da Grã-Bretanha para segurança, desenvolvimento econômico e política externa.

 

No segmento energético, esse redirecionamento pode alterar o ritmo e a forma de condução do processo de transição energética dos britânicos. Os alicerces da revolução verde do “Global Britain” sinalizam algumas ambições de longo prazo, mas não apresentam grande um comprometimento com metas de curto prazo. Por isso, esse projeto representa um novo olhar sobre a transição energética com menor clareza dos seus objetivos de curto prazo em relação ao que vem sendo feito pela União Europeia (UE).

 

» Leia também outros artigos sobre Matriz energéticaClique aqui.

 

Em junho de 2016, após a realização de um referendo popular se os britânicos deveriam ou não continuar na UE, 17,4 milhões de pessoas (52% da população) votaram pela saída da região do bloco europeu. Tal resultado acabou custando também a demissão do primeiro-ministro da Inglaterra, David Cameron, que advogava a favor da permanência na União Europeia.

 

Com isso, o país iniciou um longo processo de transição de saída da UE que contou, entre outros fatores, com o lançamento do novo projeto de inserção do país, o “Global Britain”. “Em fevereiro de 2020, Dominic Raab, o secretário de Relações Exteriores, detalhou os três objetivos centrais: provar que os britânicos são os melhores aliados, parceiros e amigos para seus vizinhos europeus; reposicionar o papel do Reino Unido como um energético promulgador do livre comércio mundial e reforçar o Reino Unido como uma força do bem ainda mais forte no mundo”, explicou um estudo da Escola de Guerra Naval.

O Global Britain deixa em dúvida como a Grã-Bretanha irá conduzir sua “revolução verde” no curto prazo

Foto: Peter Dargatz / Pixabay.

O “Global Britain” apresenta quatro grandes diretrizes que devem guiar o enquadramento estratégico (Strategic Framework) da região para o próximo período:

  1. Sustentação da vantagem estratégica da região por meio de ciência e tecnologia (C&T): utilizar a C&T como um elemento integral da segurança nacional e política internacional, fortalecendo a posição do Reino Unido com um poder cibernético global de C&T.
  2. Participação ativa da construção da ordem internacional futura: utilizar o poder de mobilização e realizar parcerias internacionais para revigorar o sistema internacional, visando assegurar que o mundo seja mais favorável às democracias e à defesa dos valores universais.
  3. Reforço da segurança e defesa em casa e no exterior: mobilizar aliados e parceiros para enfrentar os desafios à segurança no mundo físico e on-line. Para a Grã Bretanha, a OTAN continuará sendo a base da segurança coletiva na região de origem do euro-atlântico, onde a Rússia continua sendo a ameaça mais aguda à segurança. Busca-se também dar maior ênfase ao desenvolvimento das capacidades locais e globais para enfrentar ameaças transnacionais, como o terrorismo.
  4. Construção de uma resiliência local e externa: construir um modelo de desenvolvimento que torne os britânicos mais resilientes para lidar com os riscos de diferentes naturezas físicas e virtuais, como eventos climáticos extremos, ou ameaças como ciberataques.

Nesse último aspecto, há uma clara preocupação do governo britânico com as mudanças climáticas a perda da biodiversidade que “são desafios de longo prazo que, se deixados sem controle, ameaçam o futuro da humanidade”, segundo o próprio Global Britain.

 

Por isso, o documento apresenta uma visão muito clara sobre o que os britânicos denominam de “revolução verde”, um plano que deve buscar acelerar investimentos em energia limpa, gerar mais 250 mil empregos “verdes”, a partir de dez aspectos visando: (i) inovação e finanças para garantir o desenvolvimento de tecnologia de baixo carbono; (ii) produção de 40 GW de energia eólica offshore; (iii) produção de 5GW de hidrogênio verde; (iv) investimento em tecnologias de nova geração de energia nuclear; (v) emissão-zero de veículos automotores; (vi) investimento de 5 bilhões de libras em transportes verdes; (vii) projeto de pesquisa para eliminar a emissão de carbono de aviões; (viii) investimento de 1 bilhão de libras para construções civis verdes e mais eficieintes; (ix) investimento de 1 bilhão de libras em captura de carbono e (x) investimento de 5 bilhões de libras para proteger o meio ambiente e evitar enchentes.

 

O plano de “revolução verde” do “Global Britain” é, na verdade, um conjunto de diretrizes e programa de investimento em alguns segmentos de energia limpa. Embora o documento mencione o objetivo de zerar as emissões liquidas de carbono até 2050 e reverter a perda de biodiversidade até 2030, alguns especialistas consideram o projeto mais conservador do que o da UE.

 

O bloco europeu lançou recentemente o programa “Fit for 55” que coloca uma meta clara de 55% das emissões até 2030, visando assegurar que os países-membros estejam, de fato, comprometidos com o objetivo de zerar as emissões até 2050. Além disso, a UE também anunciou uma resposta mais detalhada à invasão da Ucrânia, com uma política energética sustentável incluindo a compra de gás natural, GNL e hidrogênio em toda a UE. Pesquisa de acompanhamento poderia conduzir uma análise comparativa para ver como poderia ter sido a política do Reino Unido se tivesse permanecido como membro do bloco.

 

As medidas mais assertivas e com objetivos de curto prazo da UE contrasta com objetivos mais vagos e de longo prazo da Grã-Bretanha. Dessa forma, para esses especialistas, o Brexit impede os britânicos de terem metas mais ambiciosas, uma vez que não pode compartilhar a efetivação de políticas complexas com outros países. Além disso, mostra que o projeto britânico pode não ser tão eficaz quanto a política do bloco europeu no cumprimento das metas e no impacto global das medidas adotadas.

 

Por outro lado, a saída do bloco da UE pode representar a adoção de um projeto mais autônomo sem amarras com metas de terceiros e guiar a política energética britânica por rumos próprios. A região possui uma produção relevante de combustíveis fósseis e ainda pode utilizar essa indústria como um elemento central para a segurança energética.

 

De toda forma, o Global Britain, embora assegure o compromisso britânico com a transição energética, coloca mais dúvidas do que certeza sobre o ritmo e a forma de condução da revolução verde.

 


 

Artigo publicado originalmente no Broadcast Energia.

Comentários:

Comentar