O abandono do Prominp e o retrocesso da política de qualificação profissional

Rodrigo Leão

Ao longo dos anos 1990, quando o Brasil passou a conviver com elevadas taxas de desemprego e forte precarização do emprego, cresceram os estudos sobre as transformações observadas no mercado de trabalho naquele período. Uma das teses mais defendidas no meio empresarial e na grande mídia foi que os problemas observados no mercado de trabalho derivaram da baixa qualificação da força de trabalho.

 

A abertura e liberalização econômica beneficiariam a economia por intermédio do aumento da concorrência interna e da atração de setores modernos para o país. Os novos desafios colocados expunham à baixíssima qualificação do mercado de trabalho. Havia uma lógica na qual os gargalos de qualificação seria uma barreira à entrada da modernização e melhora do ambiente concorrencial da economia brasileira.

 

Foto: Divulgação.

 

Mesmo com a melhora relativa da qualificação e as iniciativas de ampliação do ensino superior e técnico naquele período, observou-se uma piora das condições relativas do mercado de trabalho. Afora a bruta expansão do desemprego, a informalidade aumentou e atingiu cerca de 55% da força de trabalho no final da década de 1990, o número de trabalhadores empregados com ensino superior cresceu timidamente de 9,6% em 1990 para 12,0% em 2000. Uma análise dos dados e discursos mostraram que o diagnóstico da baixa qualificação serviu apenas para deslocar o foco dos problemas dos empresários para a força de trabalho e não era capaz de solucionar as mazelas do mercado de trabalho brasileiro.

 

Revelou-se necessária não apenas a qualificação em si dos trabalhadores, mas a criação de uma demanda para a absorção desses empregados recém qualificados. No caso do setor petróleo, o Programa de Mobilização da Indústria Nacional de Petróleo e Gás Natural (Prominp) visou atuar tanto na oferta, como demanda de qualificação do setor petróleo. Por um lado, os fortes investimentos previstos para a cadeia de petróleo capitaneados pela Petrobras e, por outro, a crescente necessidade abertas por tais investimentos para empresas e profissionais capacitados seriam forças motrizes do Prominp.

 

Segundo os pesquisadores Cássio Garcia e André Furtado**: “o Prominp busca criar um fórum de oportunidades para o parque supridor local a partir da carteira de investimentos da Petrobras – a agente balizadora do Programa – para os próximos anos, que leve em conta a sustentabilidade e a competitividade deste segmento industrial. De acordo com as entrevistas realizadas, busca-se com o Prominp criar um novo modelo de política de compras dentro da Petrobras, diferente do modelo paternalista que vigorou na fase substitutiva de importações. Para alcançar este objetivo, a estrutura de governança criada para gerir o Programa abarcou não apenas membros do governo e da Petrobras, como também entidades da classe empresarial. Pretendeu-se com a incorporação de entidades da classe empresarial na estrutura de governança do Prominp, aproximar o governo e a Petrobras da indústria para-petroleira local, tornando possível que tal indústria exponha suas debilidades e demandas”.

 

No que diz respeito à qualificação profissional, o Prominp atuou em cinco frentes: (i) indução nos currículos de engenharia de maior conteúdo projeto; (ii) aceleração do fluxo de informações para as diferentes empresas que atuam na cadeia de petróleo e gás por meio de acordos de transferência entre empresas e universidades; (iii) maior intercâmbio de profissionais locais com empresas de engenharia do exterior; (iv) criação de incubadoras nas universidades visando reforçar competências do setor e; (v) formação de clusters locais associando o desenvolvimento de cursos locais com as demandas por investimentos do setor.

 

Como resultado desse processo, o Prominp investiu mais de R$ 300 milhões, entre 2006 e 2014, qualificando cerca de 100 mil trabalhadores e permitindo que mais de 80% das empresas nacionais conseguissem ingressar na faixa de exigência de SMS da Petrobras para participar de processos licitatórios da estatal de petróleo. No entanto, como noticiou a matéria do jornal “O Globo” semana passada***, desde 2014 o Prominp se encontra em estado de hibernação por conta dos desdobramentos da Lava-Jato. Na verdade, a interrupção das atividades de várias empresas ligadas à cadeia de petróleo e gás, bem como o forte desinvestimento da Petrobras no último triênio frustraram as expectativas criadas no Prominp. Como lembra a matéria, os 100 mil profissionais qualificados acabaram não sendo absorvidos pelo setor, principalmente após 2014.

 

Esse é mais um exemplo de retrocesso provocado pelos efeitos econômicos da Lava-Jato, bem como pela política reducionista das empresas estatais. Novamente, observa-se um descompasso entre a oferta e a demanda por qualificação profissional. Agora, encontram-se vários profissionais capacitados sem emprego ou subempregados fora das suas áreas de qualificação. Resta saber qual será o discurso agora adotado pelo empresariado e pela grande mídia.

 

Referências:

**SILVA, C. G. S.; FURTADO, A. T. Uma análise da nova política de compras da Petrobras para seus empreendimentos offshore. Revista Gestão Industrial, v. 02, n.3: p. 103-122, 2006

***ORDOÑEZ, R. Após gastos de R$ 292 milhões, programa de qualificação para. O Globo, 05 de junho de 2017.

 

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