Novo plano estratégico da Petrobras mantém os desinvestimentos

Rodrigo Leão, William Nozaki
CartaCapital
Novo plano estratégico da Petrobras mantém os desinvestimentos
Novo plano estratégico da Petrobras mantém os desinvestimentos

Sede da Petrobras Foto: Tânia Rêgo / Agência Brasil.

A Petrobras divulgou no final de novembro as novas diretrizes de seu Plano Estratégico (PE) para o período 2021-2025. Trata-se menos de uma nova estratégia e mais de um conjunto de ajustes a fim de fazer face ao novo cenário marcado pelos impactos da crise pandêmica e pela redução no preço do barril do petróleo, articulando a velha estrutura dos desinvestimentos à nova dinâmica da descarbonização. Ao tentar articular os desinvestimentos à descarbonização, o novo Plano Estratégico da Petrobras parece buscar construir um discurso modernizante pós-pandêmico para decisões conservadoras pré-pandemia.

 

 

Em outras palavras, o plano preserva os pilares estratégicos do anterior (2020-2024), mas enxuga o volume de investimentos projetados pela estatal para os próximos anos, em razão da queda do preço do barril de petróleo, e adota um discurso “mais agressivo” em relação à descarbonização, embora isso não signifique a expansão de gastos no segmento de renováveis.

 

 

Enquanto no plano anterior o planejamento estratégico da companhia se baseava no modelo de resiliência única, pautado pela sustentabilidade econômica, no plano atual o modelo aplicado é o de dupla resiliência, incorporando elementos de sustentabilidade ambiental. Se, por um lado, é relevante a incorporação de uma agenda verde na maior petrolífera brasileira, por outro lado, tal preocupação está orientada menos pelo compromisso com a transição energética e mais por pressões de fundos verdes e investidores institucionais atentos à pauta da descarbonização, além de antecipar o alinhamento da empresa à nova política energética e petrolífera do governo e das empresas norte-americanas.

 

 

A Petrobras preserva três das suas cinco métricas de topo – a taxa de acidentes registráveis, a dívida bruta e o valor econômico agregado. As novidades são a incorporação das seguintes métricas: (i) o volume vazado de óleos e derivados que tem como objetivo, dentro outros, responder ao fato de que em 2019 a companhia registrou um aumento de 95,5% de vazamentos de petróleo em 17 ocorrências, e (ii) a intensidade de emissão de gases do efeito estufa. O compromisso com a descarbonização, entretanto, toma como referência o ano base de 2015 quando a empresa era maior e mais verticalizada do que atualmente.

 

 

A entrada desses dois novos indicadores mostra a preocupação da Petrobras com a questão socioambiental, principalmente relacionada à descarbonização. Os objetivos de reduzir as emissões de CO2, a geração de resíduos e a utilização de água nas suas operações associados à busca por otimizar a utilização do gás e promover da biodiversidade mostram, para o mercado e à sociedade, um maior engajamento da Petrobras na área socioambiental. Apesar disso, o percentual de investimento planejado pela companhia nessas iniciativas (1,8%) está muito abaixo em relação a outras petrolíferas, em especial as europeias. Para o mesmo período, a francesa Total, por exemplo, pretende destinar cerca de 15% dos seus investimentos para o segmento de energia limpa.

 

 

Além da queda dos investimentos, a Petrobras deve continuar reduzindo sua atuação no segmento de renováveis. O PE 2021-2025 afirma que a companhia deve manter seus desinvestimentos na BSBios e PBIO seguindo o que foi feito até o final do ano passado. Em 2019, a Petrobras realizou a venda de 50% da participação na Belém Bioenergia Brasil (BBB), além do anuncio da venda das usinas termelétricas de Camaçari (BA) e Canoas (RS), das usinas eólicas de Mangue Seco 1, 2, 3 e 4 em Guamaré (RN), e das ações da BSBios nas usinas de Biodiesel de Passo Fundo (RS) e Marialva (PR).

 

 

Ao que tudo indica, as metas caminham para a constituição de um processo produtivo mais limpo de petróleo e derivados da porta para dentro da empresa, mas sem maiores compromissos com a descarbonização da porta para fora da empresa. Nesse sentido, os ajustes apresentados fazem com que a Petrobras adote uma estratégia mais próxima das petrolíferas dos EUA do que das petrolíferas da Europa e da Ásia.

 

 

A Petrobras ainda mantém a sua meta de desinvestimentos e descapitalizações, sinalizando que pretende acelerar a venda de cerca de 50 ativos, concentrando sua atuação na área de exploração e produção (E&P) do pré-sal nas costas do RJ e de SP. Se o plano anterior já apresentava uma taxa menor de investimentos quando comparada a períodos anteriores, cerca de US$ 75,7 bilhões, o plano atual apresenta números ainda mais tímidos – os investimentos devem cair para cerca de US$ 55 bilhões, dos quais US$ 46 bilhões devem ser alocados em E&P, sendo US$ 32 bilhões apenas em águas profundas e ultraprofundas.

 

 

Cabe ressaltar que, além da focalização nos ativos do pré-sal, a maior parte dos investimentos (86%) está concentrada na produção em vez de na exploração (14%). Embora isso seja comum no perfil de investimento da estatal, esse valor é relativamente mais baixo em comparação com o período 2006 a 2008, quando os investimentos planejados em exploração representavam quase 20% do total do segmento de E&P. Isso pode sinalizar que a atual gestão da estatal não prioriza na sua estratégia a reposição de reservas, que já vem em queda nos últimos anos atingindo o nível mais baixo do século XXI.

 

 

É preciso olhar com atenção também as mudanças que devem ocorrer no segmento de refino, marcados nos últimos anos pela desregulamentação e pela privatização. Nesta área, por exemplo, os investimentos do PE 2021-2025 caíram 53,7% em relação ao plano 2020-2024, saindo de US$ 8,0 bilhões para US$ 3,7 bilhões. Além da venda das refinarias, o novo plano indica que a Petrobras deve reduzir os recursos destinados ao processo de modernização e inovações das cinco refinarias que ficarão com a empresa, uma vez que as outras sete serão vendidas nos próximos anos.

 

 

O PE 2021-2025 mostra que a Petrobras mantém a estratégia de focar a sua atuação na produção de petróleo do pré-sal, tentando reduzir os impactos ambientais desse processo. Nas demais áreas de atuação (refino, comercialização, gás e energia), o futuro deve ser marcado pelo desaparecimento da participação da estatal.

 


 

 

Texto publicado originalmente na CartaCapital.

 

 

William Nozaki é coordenador-técnico do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep) e professor da Escola de Sociologia e Política de São Paulo (Fespsp).

 

 

Rodrigo Leão é coordenador-técnico do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep) e pesquisador visitante do Núcleo de Estudos Conjunturais da UFBA.

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