Descomissionamento offshore: desafios e oportunidades

João Montenegro
TN Petróleo

O Brasil tem 54 plataformas marítimas de produção de petróleo e gás (49 fixas e cinco semissubmersíveis) com mais de 25 anos de existência, de acordo com dados da ANP [1]. Trata-se, portanto, de um contingente potencialmente sujeito ao descomissionamento, considerando-se que a vida útil dessas unidades gira entre 20 e 30 anos, em média.

 

 

Quase metade delas (23) está na bacia de Sergipe, cuja produção marítima total, hoje, não passa de 357,26boe/d, ante o pico de 32,5 mil boe/d registrado em julho de 2008. Oito foram retiradas de operação pela Petrobras no ano passado, quando a COVID-19 começava a se alastrar pelo país e a companhia decidiu hibernar diversos campos para segurar a produção.

 

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Outras 15 estão na bacia de Campos, que, nos últimos dez anos, vem registrando forte declínio de sua produção em função do amadurecimento dos campos da região e do foco da Petrobras no pré-sal da bacia de Santos.

 

 

As demais plataformas acima de 25 anos estão nas bacias do Ceará (nove) e Potiguar (sete). A primeira está sem produzir desde abril de 2020, depois de ter suas nove instalações marítimas retiradas de operação pela estatal, enquanto a última – que teve cinco das sete paralisadas ano passado – extrai cerca de 3,2 mil boe/d, ante os mais de 30 mil boe/d produzidos em 2005.

 

Descomissionamento offshore desafios e oportunidades

Foto: gui1303 / Pixabay.

 

Apenas uma delas, Pampo 1, não está em um projeto da Petrobras. Com 37 anos de idade, a unidade opera no campo de Pampo, na bacia de Campos, adquirido pela Trident Energy da petroleira brasileira em 2019.

 

 

O país tem ainda outras 34 plataformas entre 15 e 25 anos – unidades já elegíveis ao descomissionamento ou que poderão estar em tal condição nos próximos anos.

 

 

Diante desse cenário, a ANP prevê que serão necessários 27 bilhões de reais em investimentos em atividades de descomissionamento offshore entre 2021 e 2025. Do total, 17,8 bilhões de reais serão destinados ao arrasamento e abandono de 587 poços e 9,1 bilhões de reais à retirada de equipamentos.

 

 

No momento, há 30 planos de desativação de instalações (PDIs) aprovados pela ANP, metade dos quais referentes a projetos na bacia de Campos [2]. Outros dois aguardam resposta (campos de Oliva e Sardinha, em Santos e Camamu) e cinco encontram-se suspensos (Moreia e Nordeste de Namorado, em Campos, Arabaiana e Oeste de Ubarana, no Rio Grande do Norte, e Salgo, em Sergipe).

 

 

Desse total, apenas quatro são operados por petroleiras privadas: Bijupirá/ Salema (Shell), Polvo (PetroRio), Tubarão Azul (Dommo Energia) e Oliva (Enauta).

 

 

Ainda segundo agência reguladora, há pelo menos três unidades de produção offshore com PDI já aprovado programadas para serem descomissionadas entre 2021 e 2022: P-32, no campo de Viola, P-33, em Marlim, e o FPSO Fluminense, em Bijupirá e Salema. Também com PDI aprovado e na locação, o FPSO Capixaba, em Jubarte, ainda não tem previsão de descomissionamento.

 

 

Sem detalhar os projetos, o plano de negócios da Petrobras para o próximo quinquênio (2022-26) prevê custos de descomissionamento da ordem de US$1 bilhão ao ano. O plano anterior previa a retirada de 18 plataformas entre 2021 e 2025: as fixas Agulha (PAG–03) e Biquara (PBIQ-01) e as flutuantes P-18, P-19, P-20, P-26, P-35, P-37 e P-47, cujos PDIs constam como encerrados no sistema da ANP, e os FPSOs Piranema e Capixaba, as três fixas do campo de Cação (PCA 1, 2 e 3) e as flutuantes P-7, P-15, P-32, P-33, cujos PDIs aparecem como aprovados no painel dinâmico da agência reguladora.

 

 

As atividades de descomissionamento offshore trarão novas oportunidades de negócios para a indústria naval brasileira, que agoniza desde 2014 devido à “tempestade perfeita” resultante da combinação da queda do preço do barril de petróleo iniciada naquele ano com os efeitos da operação Lava Jato, a qual atingiu em cheio estaleiros, empresas de engenharia e epecistas nacionais.

 

 

Este ano, o Consórcio Piauí-Alabama, constituído pela Triunfo Logística, Sea Partners Navegação e Logística, Método Engenharia e Shore Offshore Services, concluiu a retirada das três plataformas fixas do campo de Cação, na bacia do Espírito Santo, para a Petrobras.

 

 

Também recentemente, o consórcio Decom Ambiental, composto pelas empresas capixabas SA Ambiental, SB2 Engineering e Plamont Engenharia, venceu uma licitação da estatal para descomissionamento do Almoxarifado Submarino (Alsub). O projeto prevê abrir 115 empregos diretos e 300 indiretos [3].

 

 

No entanto, ainda é relativamente tímida a adesão da cadeia produtiva local no sentido de se capacitar e habilitar para participar das atividades de descomissionamento, as quais envolvem – além da retirada dos equipamentos do mar – seu desmantelamento, reciclagem e tratamento de resíduos radioativos e biológicos.

 

 

O risco, com isso, é que boa parte das plataformas flutuantes a serem descomissionadas sejam diretamente rebocadas para fora do país, sem que a indústria local absorva o valor potencial da atividade – o qual, cumpre ressaltar, é bem inferior ao da construção naval e offshore, da qual o Brasil praticamente abriu mão ao flexibilizar as exigências de conteúdo local nos contratos de E&P.

 

 

Quanto às plataformas fixas, o nível de criticidade das operações de descomissionamento dessas unidades será, em muitos casos, maior que o de Cação, por exemplo, cuja lâmina d’água é de apenas 19 m, exigindo trabalho mais custoso e arriscado. E, com os desinvestimentos em águas rasas da Petrobras, a tendência é que sua desativação fique sob responsabilidade de empresas de pequeno e médio porte.

 

 

Entre 2015 e 2021, a ANP identificou 13 incidentes na etapa de descomissionamento offshore, todos ocorridos em dez campos marítimos operados pela Petrobras (Badejo, Linguado, Marlim, Marlim Sul, Sururu, Namorado, Espadarte, Tupi, Bicudo e Piraúna). Do total, seis casos relacionam-se com queda/rompimento de risers, cinco se referem a vazamento/descarga de água oleosa ou de fluido no mar e um envolve o vazamento de água com H2S na unidade.

 

 

Com o FPSO Rio de Janeiro, que operava no campo de Espadarte, ocorreram acidentes de perda de integridade do casco (corrosão severa) em janeiro e em agosto de 2019, que resultaram em descarga de óleo no mar.

 

 

Para as petroleiras, o melhor negócio é deixar as estruturas submersas nas locações, transformando-as em recifes artificiais, conforme o modelo chamado rig-to-reef (de plataforma a recife).

 

 

Porém, de acordo com a resolução que dispões sobre o descomissionamento de instalações offshore (nº 817/2020 [4]), quaisquer instalações deverão ser removidas das áreas sob contrato, com a remoção parcial ou a permanência definitiva in situ sendo “permitida apenas em caráter de exceção, desde que atendidos os requisitos normativos aplicáveis e devidamente justificada”.

 

 

Se, por um lado, o rig-to-reef pode enriquecer a vida marinha local e evitar a emissão de gases pela queima de combustível que seria necessária para a remoção da estrutura, por outro, há potenciais riscos de vazamento de produtos químicos devido à corrosão bem como à mobilidade da fauna marinha em determinados casos. Plataformas desativadas em função de problemas estruturais, por exemplo, não são candidatas adequadas a se tornarem recifes artificiais.

 

 

Portanto, as atividades de descomissionamento offshore no Brasil implicarão oportunidades de negócios – que poderão (ou não) ser absorvidas pela cadeia produtiva local – e riscos ambientais, que devem ser monitorados de perto pela indústria e, sobretudo, pelas autoridades federais competentes brasileiras, a saber ANP, Marinha e Ibama.

 


 

Fontes:

[1] Disponível em:<https://app.powerbi.com/view?r=eyJrIjoiNGFlZDI4MDAtZDJhNi00MGEyLWFjMzAtNTBkMDVjOTg1NzY0IiwidCI6IjQ0OTlmNGZmLTI0YTYtNGI0Mi1iN2VmLTEyNGFmY2FkYzkxMyJ9&pageName=ReportSection65e3c25239431311238c>. Acesso em: 20 de nov. 2021.

[2] Os PDIs envolvem abandono de poços e/ou descomissionamento de plataforma e sistema submarino.

[3] Disponível em<https://tribunaonline.com.br/economia/mil-empregos-na-area-do-petroleo-a-partir-de-setembro-100050>. Acesso em 20 de nov. 2021.

[4] Disponível em:<https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/resolucao-n-817-de-24-de-abril-de-2020-254001378>. Acesso em 29 de nov. 2021.

 

 

Artigo publicado na TN Petróleo.

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