As petroleiras independentes e a indústria de óleo e gás no Brasil

Francismar Cunha Ferreira
Valor Econômico
Companhia de óleo e gás perfura rocha de reservatório para descobrir combustível. Foto: cecop15/Getty Images.

A atuação das petroleiras independentes no Brasil tem se destacado nos últimos anos. Os desinvestimentos promovidos pela Petrobras, juntamente com o surgimento de novas regulamentações, impulsionaram a expansão do segmento.

 

Companhia de óleo e gás perfura rocha de reservatório para descobrir combustível. Foto: cecop15/Getty Images.

Petroleiras independentes podem desempenhar um papel importante, especialmente em áreas maduras e de acumulações marginais que não atraem a atenção das grandes petroleiras. Foto: cecop15/Getty Images.

 

No entanto, aumentar o fator de recuperação dos ativos com o objetivo de manter e ampliar a produção com segurança operacional, construir novas infraestruturas e realizar avanços exploratórios, especialmente em direção a novas fronteiras, são desafios para essas petroleiras, que, diferentemente da Petrobras e de outras majors, possuem menor escala operacional e capacidade financeira.

 

Existem pouco mais de 60 grupos petroleiros independentes no Brasil. De acordo com a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), no primeiro semestre de 2024, a produção operada pelas independentes foi em torno de 305 mil barris de petróleo equivalente por dia (mboe/d), o que representa cerca de 7% da produção nacional.

 

 

Uma década atrás, em 2014, a produção das independentes foi próxima de 64 mboe/d, correspondendo a cerca de 2,8% da produção brasileira. Em dez anos, a produção das independentes quase quintuplicou.

 

O aumento da participação das independentes no Brasil está associado à política de desinvestimentos da Petrobras, desenvolvida entre 2015 e 2022. A estatal, visando maior rentabilidade no curto prazo, reduziu seus investimentos e passou a priorizar os ativos de alta rentabilidade no pré-sal.

 

Dessa forma, a Petrobras abriu mão da revitalização dos campos maduros terrestres, de águas rasas e do pós-sal, colocando-os à venda. Esse processo representa uma espécie de segunda fase de abertura do setor de petróleo e gás no país, que se desenvolveu internamente na Petrobras.

 

A primeira fase ocorreu em 1997, com a promulgação da Lei do Petróleo, que quebrou o monopólio estatal do setor. Nesse contexto, as independentes desenvolveram suas atividades a partir de operações exploratórias, assumindo riscos geológicos e, posteriormente, promovendo o desenvolvimento de seus ativos até alcançarem a produção de óleo e/ou gás.

 

No contexto da “segunda” abertura, essas empresas adquiriram ativos já em produção, o que viabilizou rápido fluxo de caixa para os novos operadores. O foco dessas empresas passou a ser a maximização do fator de recuperação dos campos, com ênfase no aumento da produção e na extensão da vida produtiva dos campos.

 

Novas regulamentações no E&P contribuíram, em certa medida, para a viabilização das operações das independentes. Destacam-se, por exemplo, as medidas adotadas pela ANP, como a redução dos royalties para incentivar a produção incremental em campos maduros (Resolução Nº 749/2018) e a diminuição das alíquotas de royalties para pequenas e médias petroleiras (Resolução Nº 853/2021).

 

Também são relevantes o enquadramento de campos e acumulações de petróleo e gás natural que apresentam viabilidade econômica ou produção marginal (Resolução 877/2022). A possibilidade de as empresas que adquirirem campos maduros desenvolverem um novo plano de desenvolvimento e utilizarem as reservas como garantia para empréstimos bancários (Reserve Based Lending) (Resolução 785/2019) é igualmente significativa.

 

Além disso, foram implementadas outras medidas visando à prorrogação dos contratos de concessão pela ANP, conforme autorização do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE).

 

Com o encerramento do ciclo de desinvestimentos da Petrobras, as independentes tendem a ingressar em um cenário de consolidação. Por um lado, elas irão investir na revitalização dos ativos, mas também poderão manter, em menor proporção, as estratégias de aquisições, vendas e fusões.

 

Em 2022, por exemplo, a Petrorecôncavo adquiriu os ativos da Maha Energy Brasil. Em 2024, ocorreu a fusão entre a 3R e a Enauta, resultando na criação da Brava Energia. Por outro lado, aquisições e vendas ainda tendem a ocorrer.

 

Somente em 2024, na Bacia de Campos, a Prio adquiriu da Sinochem uma participação de 40% no campo de Peregrino, e a antiga Enauta comprou 23% da participação da Qatar Energy no Parque das Conchas.

 

Outras independentes têm ampliado suas atividades para segmentos que possibilitam sinergias com o setor de óleo e gás. Nesse sentido, destacam-se a geração de energia elétrica utilizando parte do gás natural produzido em seus ativos, por meio de termelétricas próprias, e, até mesmo, o desenvolvimento de projetos de estocagem de gás em reservatórios depletados.

 

Em resumo, as fusões e aquisições, bem como a entrada em outros segmentos, representam um movimento estratégico em que as empresas independentes buscam otimizar seus portfólios, aumentar suas reservas e se tornarem menos suscetíveis às variações dos preços da commodity.

 

O governo vem buscando mecanismos que têm contribuído para a consolidação e a expansão das independentes. Entre esses, destacam-se os leilões em formato de oferta permanente realizados desde 2022 e, mais recentemente, o programa Potencializa E&P, que, entre outras ações, visa estimular a exploração, o desenvolvimento e a produção de petróleo e gás natural em áreas de fronteiras exploratórias e em campos e acumulações marginais, atraindo investimentos privados.

 

Por outro lado, discussões regulatórias que impactam diretamente as operações das empresas independentes seguem em andamento junto aos órgãos competentes.

 

 

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Aumentar o fator de recuperação dos ativos, com o objetivo de manter e ampliar a produção, atuar com segurança operacional, construir novas infraestruturas e realizar avanços exploratórios, especialmente em direção a novas fronteiras, são desafios para as empresas independentes.

 

De toda forma, essas companhias podem desempenhar um papel importante, especialmente em áreas maduras e de acumulações marginais que não atraem a atenção das grandes petroleiras. Suas operações, articuladas com políticas econômicas regionais e nacionais, tendem a contribuir para o desenvolvimento social e econômico de diversas regiões inseridas no circuito da indústria de petróleo e gás do Brasil.


Artigo publicado originalmente no Valor Econômico.