Alta nos preços dos combustíveis garantem superlucro para Petrobras em 2021

Mahatma dos Santos, Rafael Rodrigues da Costa
CartaCapital
Alta nos preços dos combustíveis garantem superlucro para Petrobras em 2021

A Petrobras divulgou na quarta-feira (23/02) os resultados operacionais e financeiros do balanço anual de 2021. O lucro líquido da empresa foi de R$ 106,7 bilhões, o maior de sua história.

 

Esse resultado foi fortemente impactado pelo expressivo aumento das receitas de venda, decorrentes da elevação dos preços dos derivados, e pela redução das despesas operacionais. Ademais, cabe ressaltar que alguns itens não recorrentes, como venda de ativos, também contribuíram para esse lucro gigantesco. As receitas com venda de ativos, por exemplo, atingiram R$ 25,5 bilhões em 2021, aumento de 149,6% em relação a 2020.

 

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Dois terços desse lucro, porém, ficarão nas mãos dos acionistas. O volume de dividendos distribuídos aos acionistas será de R$ 101,4 bilhões em 2021, dos quais R$ 64 bilhões já foram pagos e outros R$ 37,3 bilhões serão pagos em abril de 2022.

 

Alta nos preços dos combustíveis garantem superlucro para Petrobras em 2021

Posto de combustíveis de Brasília em 2018. Foto: Leopoldo Silva / Agência Senado.

O lucro foi explicado, em boa medida, pela elevação de 66,4% na receita total de vendas, na comparação com 2020, contabilizando 452,6 bilhões de reais. A receita de vendas, por sua vez, foi puxada tanto pelo aumento no volume de vendas de diesel e gasolina para o mercado interno, quanto pela elevação dos preços desses combustíveis (em média, 63,7% mais altos que no ano anterior).

 

Reflexo da política de preços de paridade de importação (PPI) adotada pela estatal – que reajusta o preço dos derivados a partir de mudanças nas cotações internacionais do petróleo, na taxa de câmbio e custos logísticos -, o crescimento das receitas da Petrobras no mercado brasileiro foi puxado pelas altas de preços dos derivados. Na variação anual (2021 versus 2020), enquanto a quantidade de derivados vendidos no mercado interno cresceu apenas 8,6%, os preços dos derivados aumentaram em 63,7%, em média. Tal variação fez com que a receita de vendas da companhia no mercado interno saltasse nada menos que 78,6% em 2021, ficando em R$ 329,8 bilhões.

 

As vendas para o mercado externo também tiveram um peso importante nos resultados deste trimestre. Isso porque mesmo com a queda no volume total de exportações de petróleo e derivados (que sofreram uma retração de 15,3% em comparação a 2020), o aumento generalizado nos preços do petróleo cru e derivados mais que compensaram o volume reduzido de exportações, resultando em uma receita de R$ 115,7 bilhões, 44,3% maior ao registrado no ano passado. Nesse caso, cabe destacar o desempenho superior das exportações de óleo combustível em relação ao petróleo cru, o primeiro cresceu 65,5% e o segundo 36,7%. Isso mostra a importância do parque de refino no crescimento da geração de receita da companhia no mercado externo.

 

Por outro lado, a Petrobras também aumentou o seu volume de importações. Com o objetivo de suprir o aumento da demanda de derivados no mercado interno, a companhia quase duplicou as importações de derivados, que saltaram de 42 milhões de barris, em 2020, para cerca de 80 milhões de barris em 2021 (crescimento de 90%). O aumento nas importações representou um gasto de R$ 86,9 bilhões em 2021, expansão de 178,4% na comparação anual.

 

Essa expansão das importações associada à elevação do nível de utilização (FUT) de suas refinarias de 80%, em 2020, para 83%, em 2021 (no último trimestre chegou a 88%), mostra que a companhia está recuperando parte do market share no mercado consumidor nacional. Isso coloca em xeque a estratégia da empresa em insistir nas vendas de diversas de suas refinarias.

 

De modo geral, porém, em 2021 as despesas operacionais da Petrobras apresentaram uma significativa queda, saindo de 71,0 bilhões em 2020 para 17,2 bilhões em 2021, uma retração de 75,8%. Segundo a companhia, essa redução está associada a reversão de impairment de R$ 16,9 bilhões em 2021, além da redução nas despesas com vendas e gerais e administrativas, refletindo principalmente menores volumes exportados e menores despesas com frete. A diminuição nas despesas tributárias também teve um papel decisivo nessa redução.

 

A elevação da receita total de vendas foi o item que mais afetou positivamente o lucro antes do resultado financeiro e impostos (cerca de 234,6 bilhões) em 2021. Esse lucro aconteceu mesmo com o resultado financeiro negativo de 59,3 bilhões de reais, refletindo, principalmente, as perdas cambiais, sem efeito caixa, relacionados à desvalorização do real em relação ao dólar.

 

Ainda sobre as finanças, a Petrobras reduziu consideravelmente o seu nível de endividamento em 2021, alcançando uma relação dívida líquida/EBITDA de 1,09 – valor bem abaixo do que a meta de 2,5 que a empresa havia sinalizado em 2017 como principal motivo para sua política de desinvestimentos. Essa redução do endividamento foi possível com a ampliação de 37,1% na geração de recursos operacionais em 2021. Isso permitiu que a Petrobras pagasse suas despesas financeiras sem necessidade de captação de novos financiamentos.

 

Tendo em vista que as dívidas estão dentro da meta, o que justifica persistir em venda de ativos que reduz a possibilidade futura de geração de receita por parte da companhia?

 

Os dados em tela, portanto, revelam o retrato mais acabado da atual gestão da Petrobras. Mostram como a companhia tem aproveitado a volatilidade dos preços internacionais para obter lucros extraordinários às custas do consumidor brasileiro, que tem sofrido com os efeitos perversos da inflação, enquanto os acionistas da estatal recebem dividendos recordes de R$ 101,4 bilhões. Esse valor, aliás, representa o equivalente a dois terços de todo o lucro da companhia em 2021, reiterando assim o compromisso predatório da administração em remunerar os seus acionistas “a qualquer custo”.

 

Quais são os limites da maximização dos lucros da Petrobras, uma empresa sob controle majoritário do Estado brasileiro? Os preços dos derivados não podem estar vinculados apenas a questões microeconômicas (de maximização dos lucros privados). O seu debate deve considerar o desafio da segurança de abastecimento energético do mercado interno – hoje e no futuro. Esse debate tem de abarcar questões como política energética, desenvolvimento econômico e garantia de acesso aos recursos energéticos, tanto ao setor produtivo, quanto à população mais vulnerável. Isso passa, entre outras coisas, por mudanças na política de preços da Petrobras e pela revisão urgente da sua política de desinvestimento.

 


 

 

Artigo publicado originalmente na CartaCapital.

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