A privatização e a nova dinâmica competitiva do mercado de combustíveis na Bahia
Jornal GGN
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Os dois primeiros meses de 2024 foram marcados por eventos que exerceram forte pressão potencial sobre os preços dos derivados do petróleo no Brasil. No plano internacional, o agravamento do conflito no Oriente Médio fez com que o Mar Vermelho, uma importante rota petroleira, se tornasse cenário de confrontos, forçando a utilização de vias de navegação mais distantes.
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Turbulência internacional e a reoneração tributária devem impactar, em especial, o mercado de combustíveis da Bahia. Foto: Divulgação/Acelen.
Com isso, verificou-se um incremento nos custos de frete e de seguro marítimo, o que resultou na consequente elevação do preço final do óleo cru.
Paralelamente, no âmbito nacional, foi implementada a reoneração dos tributos federais (PIS/COFINS) e estaduais (ICMS) sobre os derivados de petróleo, cujo efeito nos preços desses produtos é esperado, sobretudo nas regiões Norte e Nordeste.
A princípio, no Nordeste, a turbulência internacional e a reoneração tributária devem impactar em especial o mercado de combustíveis da Bahia. Nesse estado, a Acelen opera quase como um monopólio na região metropolitana de Salvador e no Recôncavo, beneficiando-se da proteção de mercado proporcionada pela distância e pela falta de capilaridade logística dos competidores. Além disso, tem mercado preferencial em áreas do Nordeste e do Norte de Minas Gerais.
Entretanto, caso haja um substancial aumento no diferencial de preços, a Petrobras poderia ameaçar o domínio de mercado da Acelen na região no longo prazo. Isso seria possibilitado, sobretudo, pelo incremento da produção nas refinarias do Sudeste e na RNEST, conforme planejado pela estatal.
Nesse cenário, também deve-se considerar que, desde o início das operações na Bahia, a Acelen tem direcionado parte de sua produção para a fabricação de óleo bunker destinado à exportação, diminuindo assim sua oferta de derivados, como o diesel, para o mercado interno.
A Petrobras, quando divulgou sua nova política de preços em maio de 2023, sinalizou a intenção de explorar novos mercados. Para a empresa, a mudança possibilita mais flexibilidade para praticar preços competitivos, se valendo de suas melhores condições de produção e logística e disputando mercado com outros atores que comercializam combustíveis no Brasil.
Essa vantagem competitiva pode ser ainda reforçada se houver avanços na otimização logística e na expansão do refino em unidades capazes de atender o Nordeste.
Com a política, a estatal se desobrigou da vinculação estrita aos Preços de Paridade de Importação (PPI), o que faz com que os preços internos não sejam imediatamente impactados pelas oscilações nos preços internacionais. Com mais flexibilidade, a estatal tem o potencial de desafiar os mercados e as margens de lucro de concorrentes, pressionando-os a reavaliar suas estratégias operacionais.
A reação dos competidores à liderança de mercado exercida pela Petrobras pode servir como um teste para a sua política de preços. De fato, já em maio de 2023, a Acelen modificou sua política de preços e, logo após, ainda no mesmo mês, foi notificada pelo Procon-BA exatamente por ter acompanhado o movimento da Petrobras e reduzido seus preços.
Outro ponto relevante é que, diferente dos atores privados, a Petrobras mitigou os impactos do retorno dos tributos federais e estaduais em âmbito nacional. Isso foi alcançado por meio da redução dos preços dos derivados em suas refinarias, de modo a absorver parte dos efeitos do retorno dos impostos quando as medidas fossem efetivadas.
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A pressão nos preços internacionais do petróleo nos últimos dois meses, aliada à nova política de preços implementada pela Petrobras desde maio do ano passado, tem potencial para intensificar a concorrência nas regiões atendidas pela Acelen – já que a empresa é particularmente suscetível às flutuações internacionais.
Além disso, a melhoria da logística da Petrobras para atender à região a partir das unidades existentes – via investimentos realizados pela Transpetro em navegação de cabotagem e expansão de dutos –, bem como a volta da Petrobras ao setor de distribuição, representa um desafio adicional.
Assim, a Acelen provavelmente terá que reconsiderar sua estratégia operacional e sua política de preços, que por manter a vinculação ao PPI, até então, servia como garantia de rentabilidade para seus investidores. A empresa pode precisar explorar formas de associação com a Petrobras, visando evitar a instalação de uma competição efetiva com a líder nacional do setor.
Artigo publicado originalmente no Jornal GGN.