A necessidade de rever o futuro da indústria de óleo e gás e da Petrobras

Jean-Paul Prates, Rodrigo Leão, William Nozaki
Folha de S.Paulo
A necessidade de rever o futuro da indústria de óleo e gás e da Petrobras

Nos últimos 20 anos, a indústria de petróleo e gás passou por imensas transformações no Brasil. Nesse período, o país promoveu mudanças regulatórias importantes que, combinadas com os investimentos de diferentes players, principalmente a Petrobras, alcançaram resultados significativos. O país conquistou a autossuficiência em petróleo cru com a descoberta do pré-sal, aumentou sua capacidade de produção de derivados, atraiu investimentos privados na produção de campos maduros e ampliou significativamente a rede de distribuição de combustíveis.

 

Todavia, desde 2016, algumas mudanças na gestão da política de óleo e gás e da própria Petrobras colocaram novos desafios para a indústria. O principal deles diz respeito à abertura do refino e à adoção da paridade do preço dos combustíveis ao valor internacional que não trouxeram, até o momento, os resultados esperados. Em vez de atração de investimentos e preços competitivos, o Brasil passou a conviver com a crescente volatilidade dos preços internos, a ausência de investimentos novos no parque de refino nacional e o aumento da dependência de importações para abastecer o mercado interno. Por exemplo, a importação de diesel, que era de 12% em 2015, já está em torno de 25% neste ano de 2022.

 

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Além disso, nesse período, abriu-se uma oportunidade para as empresas de petróleo  ingressarem na produção de energia limpa, integrando os seus negócios de óleo e gás com a indústria de renováveis.

 

A necessidade de rever o futuro da indústria de óleo e gás e da Petrobras

Imagem: Maria Maltseva / Pixabay.

A superação desse desafio e o aproveitamento dessa oportunidade explicitam a importância de as empresas de petróleo, cada vez mais, atuarem de forma integrada como grandes conglomerados de energia. É isso que vários players têm feito em diferentes localidades do mundo.

 

A petrolífera francesa Total mais que triplicou seus investimentos em renováveis nos últimos quatro anos. A anglo-holandesa Shell inaugurou recentemente um complexo integrado de refino e petroquímico nos EUA e deve lançar mais dois empreendimentos até 2024. Até a americana Chevron, que não tem priorizado a atuação em renováveis, recentemente, adaptou uma de suas refinarias em biorrefinaria na Califórnia.

 

Por isso, para lidar com esse novo cenário, é necessária uma revisão da atual política de óleo e gás e da estratégia da Petrobras. Especificamente em relação ao downstream nacional, as medidas de promoção da concorrência devem ser conciliadas com ações que visem reduzir nossa vulnerabilidade externa no abastecimento doméstico. Para isso, a recuperação dos investimentos no refino nacional, envolvendo os players locais e potenciais parceiros, é vital para o futuro da indústria.

 

Em relação aos renováveis, a Petrobras precisa seguir o caminho de seus pares globais. A empresa deve aproveitar as potencialidades do mercado nacional, as sinergias existentes entre a indústria de óleo e gás e de renováveis, além das próprias competências criadas pela empresa, como a Petrobras Biocombustíveis, para se inserir no ramo de energia limpa. A empresa precisa incorporar na sua estratégia de mudança climática não apenas a descarbonização, mas a produção de biocombustíveis limpos e de geração de energia utilizando fontes renováveis.

 

Essas medidas não dialogam com o passado, pelo contrário, mas com o futuro e a sustentabilidade da nossa indústria energética. Manter a estratégia de se concentrar apenas na produção de energia suja e continuar dependente das importações de derivados é que nos ameaça com um passado conhecido de perder nossa soberania energética e contribuir com a poluição do planeta.

 


Artigo publicado originalmente na Folha de S.Paulo.

 

Notas:

  1. Jean-Paul Prates é mestre em Planejamento Energético e Gestão Ambiental pela Universidade da Pennsylvania e Senador da República
  2. Rodrigo Leão é doutorando em Economia Política Internacional pela UFRJ e Diretor Técnico do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep)
  3. William Nozaki é professor da FESP/SP e Diretor Técnico do Ineep
  4. Os autores fazem parte do Grupo de Trabalho de Minas e Energia na equipe de transição do governo Lula.

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