Próximos anos: grandes mudanças no mundo do petróleo e gás. E o Brasil?

José Sérgio Gabrielli

As grandes potencias mundiais continuam querendo assegurar o acesso as fontes de energia, especialmente aquelas destinadas a garantir a mobilidade das cargas e pessoas, além das armas e das Forças Armadas

Muitas coisas já estão acontecendo, mas as previsões para meados da próxima década indicam grandes mudanças no mundo do petróleo. Com todas as incertezas que estão associadas as previsões do futuro, algumas tendências se intensificarão: a crescente importância dos EUA, como produtor, – com a China e Índia desempenhando papel fundamental na demanda, -a grande relocalização da capacidade do refino para o Oriente Médio e Ásia, – com a diminuição do aparelho refinador nos países da OECD, – e o aumento do consumo do gás natural, que se movimentará mais globalmente.

No plano da geopolítica, há uma redução do papel do Oriente Médio como fornecedor, que, mantendo sua produção, precisa buscar novas alianças para expandir a colocação do seu produto em outros mercados. A China reforça sua posição de grande comprador, expandindo também seus investimentos diretos em outros países, principalmente os produtores de produtos energéticos.

Rússia e Arábia Saudita caminham em direções opostas, na importância dos hidrocarbonetos como armas de soberania nacional. A Rússia reforça sua posição no petróleo e gás e a Arábia Saudita tenta diversificar sua economia, buscando sair da dependência do petróleo. Na Europa, Ásia e Oriente Médio, a disputa pelo controle da logística de gás e petróleo explica grande parte dos conflitos militares da região nos últimos anos. Rússia e EUA se enfrentam na disputa do mercado de gás europeu.

As grandes potencias mundiais continuam querendo assegurar o acesso as fontes de energia, especialmente aquelas destinadas a garantir a mobilidade das cargas e pessoas, além das armas e das Forças Armadas. Os EUA se preparam para o esperado declínio de sua produção, na segunda metade dos anos vinte deste século, buscando garantir acesso a novas áreas como o pré sal brasileiro e a sua própria Costa Atlântica.

Além da relocalização das refinarias, espera-se também mudanças importantes na carga a ser processada, com queda da participação relativa do petróleo cru, especialmente os mais leves, e sua substituição por líquidos de gás natural (LGN) e biocombustíveis. O mercado consumidor também aumentará sua demanda de gasolina, em relação ao diesel. Nova onda de reestruturação do refino está por vir.

A demanda de petróleo declinará nos países da Europa, no Japão e os EUA, mas crescerá bastante na Índia, China, América Latina e África. Espera-se um arrefecimento deste crescimento, com o uso de combustíveis alternativos para a mobilidade, – como a eletricidade nos carros elétricos e híbridos, assim como um crescente uso de gás natural para o transporte, – mas sem reduzir substancialmente o uso do petróleo como fonte primária de energia.

Os EUA conseguiram sair de uma posição de importador de petróleo e gás até 2008, quando começou sua estratégia de querer ser exportador líquido de energia, a partir de 2022. O gás natural, com o aumento da produção americana, reverteu sua tendência de construção de capacidade de liquefação nas fontes de produção, – para exportar para os EUA, – com um crescimento dos terminais de regaseificação pelo mundo, aumento do comércio de longa distancia do GNL e a transformação dos EUA de um país importador em exportador, intensificando suas disputas com a Rússia na oferta de gás para a Europa, com todas as suas implicações geopolíticas.

As negociações do Brasil com a Bolívia em relação a renovação dos contratos de fornecimento de gás e o transporte através do GASBOL situam-se neste novo contexto mundial.

Com as mudanças esperadas no mundo do petróleo e gás natural, a futura inserção do Brasil será em posição subordinada, perdendo a capacidade de atuação independente, se a velocidade dos próximos leilões do pré sal continuar como previsto pelo atual governo, abrindo as novas áreas exploratórias para empresas internacionais, com objetivos de monetizar o mais rápido possível os recursos do subsolo, independente da importância do controle deste acesso, como arma de defesa da soberania nacional e afirmação do interesses do país, numa geopolítica mundial em que o acesso a estes recursos constitui um dos principais objetivos em disputa.

O Brasil aumentará suas exportações futuras de petróleo, e também será importante importador de derivados, com a esperada retomada do crescimento da economia, que implicará em nova expansão do consumo de combustíveis no país. As importações de combustíveis, principalmente dos EUA, se intensificarão, aproveitando-se das vantagens comparativas das refinarias americanas nos próximos dez anos. Depois disso, a estrutura do refino mundial se alterara, e aqueles que construíram capacidade de refino primeiro, terão melhores condições de competir.

A não existência de um plano de longo prazo de construção de capacidade de refino no Brasil também coloca o país mais vulnerável, em termos das flutuações internacionais de preços e de localização da produção, ficando mais sujeito as condições internacionais como condicionantes para o desenvolvimento nacional.

É claro que tudo isto dependerá das decisões a serem tomadas pelas autoridades brasileiras nos próximos dois a três anos, com um novo governo. Tudo pode acontecer, mas o mundo não mudará por causa do Brasil, ainda que o papel do país se torne cada vez mais importante no mundo dos hidrocarbonetos.

Comentar